sexta-feira, fevereiro 10, 2006

A Espera

Bem naquele período entre a madrugada e a manhã que tem cor amarelo ovo eu quase fechava os olhos.
Dirigindo devagar.
Poucos carros e de repente a rua ficou completamente vazia.
Só folhas das árvores nas calçadas, agora bege por causa da época, caindo no caminho. E em frente o azul, o lado oposto dos prédios.
Os pássaros começam a cantar, alguns animais vêem isso como um sinal para acordar, alguns estão indo dormir agora. Mas o fato é que algo terminou e todos sabem disso. O desespero do amanhecer. A redundância do terminar.

Ela está encostada em poste. Loira, mas não do tipo saltitante. Cabelo curto. Corte reto na altura da nuca. Jaquetinha jeans. Pequenina e de óculos.

Quer carona?

...
...
...
...
É. Você mora por aqui?
Não.
Sei.
...
...
...
Hmmm...o carro é um lugar incômodo?
Claro que não.
...
...
...(dirigindo.)
E...como começamos?
Não sei. Acho que já começou.
Claro. Mas é que tenho um pouco de pressa.Trabalho amanhã, aliás...hoje. Daqui a pouco.
O que quer dizer? Quer tomar um café?
C-Claro, pode ser.
M- mas, eu, só quero dizer, sobre o serviço.
Serviço? Meu serviço? Sou garçonete na rua 15.
De dia?
De dia.
...
...
Ah, entendi. Você achou que eu era uma prostituta.
........... Não. Não.........? ............Desculpe........
Bem....obrigado.
.... Acha isso bom?
Não é fácil ser uma prostituta...
Mas se você estava ali...não passa ônibus naquela rua. O que estava esperando?

terça-feira, fevereiro 07, 2006

domingo.

Não teve chance. Não teve a mínima chance. Ele tinha 7 anos de idade e ela 30. Ele estava na quarta série e ela tinha vários filhos maiores que ele.E um de infância. Mas nunca o tocara.

Seu tórax se estiçalhou como vidro entre o mais leve e cuidadoso toque que os seus dedos puderam conceber. Os pássaros do passeio público conversam a noite.

Ela amarrou então o cadarço dele tão segura e graciosamente, e tão sensualmente primorosa ao tocar-lhe as ancas do calcanhar que ele ofereceu-lhe o outro também.

Este também não está bem amarrado.

Ela manteve o sorriso menor que o diâmetro de um olho a outro.

Não fosse tão pequena a extensão das suas quase inexistentes nádegas, não teria sido um desperdício que tivessem sido tocadas, já que sua perna estava em cima da cadeira.

Pensou que seria um pouco pedante terminar o conto com “Vire-se e beije-me Luíse.” Seria muito filme americano. Com algum nome como “Sob a luz do luar”

Mas seria, sim pedante, certamente. Melhor, bem, se nada melhor temos a dizer, que seja somente algo bobo que desvende por fim um pequeno mistério de final clichê conhecido. Pra que se dar ao trabalho de esperar o desenvolvimento da trama? Arte moderna amigos. Não espera mais trem. Nem mesmo anda a pé. Viaja no ar através de ondas radioativas e esquentam o sol cada dia um pouco mais. Mas os filhos protegidos de Deus nunca andam a pé. Tem algo a ver também com a vez que acenou para o avião do portão a noite e este respondeu piscando as luzes.

Nós taurinos não sabemos a hora de calar a boca.
Sempre perdemos uma boa chance de ficar quietos.
Se eu fosse virginiano, o filme seria francês.

Luíse, me dê um beijo, agora.

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